segunda-feira, 11 de março de 2019


Quantas datas cabem na história dos dias?
Quantas entram para a história da humanidade?
Quantas se tornam senha de banco?
Quantas só lembro porque são senha do wi-fi?
Quantas eu esqueço?

11 de março é o 70.º dia do ano no calendário gregoriano (71.º em anos bissextos). Faltam 295 para acabar o ano.

Em 1641 o exército de guaranis, no território das Reduções, derrotou uma bandeira de escravistas paulistas na batalha de M'Bororé.

Já em 1985, Mikhail Gorbachev é eleito secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética, dando início às reformas internas do sistema socialista.

Em 1999, houve um blecaute que atingiu 70% dos territórios brasileiro e paraguaio, mas não atingiu a região central do Rio Grande do Sul nem as regiões Norte e Nordeste.

No calendário do ano de Dois mil e Onze o dia 11 de março estava localizado na véspera do dia 12 de março. 
No dia 12 de março eu iria conquistar um importante desejo de morar e estudar no Rio de Janeiro. Meus amigos e familiares organizavam a despedida e me davam dicas de como arrumar as malas, enquanto eu pensava em você!

O exército estava nas ruas na cidade do Rio de Janeiro. Minha mãe estava preocupadíssima. Enquanto eu pensava em você!

Os bueiros explodiam nas ruas, vazamento de gás combinado com pequenas faíscas da fiação subterrânea, toda a população carioca falava disso. Enquanto eu pensava em você!

Já são 8 anos, já foram quatro cidades, não consegui contar quantas foram as casas, somamos uma cadela e um filho. Todo ano, eu penso por no mínimo três vezes, em somarmos também um videogame.

Eu sei. Eu esqueço as datas (todas as importantes), mas te explico: enquanto você aprende as datas,  eu tô distraída há oito anos pensando em você!

segunda-feira, 29 de outubro de 2018

Há um lugar onde devo ir hoje.
Um lugar onde reencontro em estado de euforia todos os que junto comigo estão tristes, derrotados, cabisbaixos. 
Conversamos sobre esse lugar tantas vezes que quando o vejo, já o reconheço. 
Serão muitas noites até chegarmos todos juntos lá.
É compreensível essa demora, porque seremos muitos e não se concluí uma caminhada em multidão do dia para a noite. 
Entretanto, quando chegarmos... mesmo que levemente ofegantes e cansados, poderemos explicar como preferimos a ordem das coisas: se primeiro o banho ou o jantar.
Falaremos sobre diversos assuntos em muitas línguas, porque devo te lembrar: que somos um mundaréu de gentes. 

Esse lugar para onde vou hoje é o lugar onde já fui com os meus amigos e os amigos deles naquele dia mesmo em que tivemos a mesma ideia, lemos o mesmo livro, lutamos pela mesma causa e  compartilhamos os nossos sonhos.
Quem haverá de nos negar a realidade do lugar onde enfim seremos o que sempre sonhamos?
Afinal, o que credita boa reputação a realidade é o que a faz coletiva. E o que constrói o real desse mundo todo é a nossa capacidade de compartilhar ideias. 
A melhor noticia que recebi nesses dias longos: é que esse lugar já existe, está partilhado em nós em formato de pequenas peças encaixáveis. 
Se você ler com atenção as letras minúsculas que acompanham o quebra-cabeça perceberá que nos avisaram que o processo de montagem é longo, trabalhoso e lindo! Juntar as peças será um enorme desafio, afinal já falamos que somos muitos. 
A melhor notícia é que já começamos. Estamos juntos! Seremos, cada vez mais, multidão! 

Existisse uma religião entre as estrelas, a galaxia do sombreiro seria como o lugar feito para se confirmar algo. Seria, afinal a terra prometida, já que a religião é o lugar onde construimos certezas para o que sequer desconfiamos.

segunda-feira, 30 de julho de 2018

Quando comecei a escrever esse texto estava há exatos 32 anos e 363 dias (considerando o exclusivíssimo ano bissexto de 2004) sendo algo no mundo.
A grande tarefa inconclusa.
Frente a frente com perspectiva assustadora do ano novo inteirinho para ser vivido, me precipitei na saudade pelos anos já passados.
O ultimo dia do ultimo ano é o dia que me ocupo em me tornar uma outra coisa, coisa pouca e minúscula.
Coisa de feitio discreto e que de tão encurtada não ocupará espaço, não valerá sua atenção.


quarta-feira, 20 de junho de 2018

A coisa que meu pai mais gosta de fazer na vida é pescar.
Se misturar com a água. Mergulhar e segurar o fôlego. Pegar o peixe com o mão e deslizar na correnteza como quem sabe o caminho do rio.
Ele fala pouco com desconhecidos. Nada em rio caudaloso com cuidado. Volta pra casa com peixe fresquinho.
A segunda coisa que meu pai mais gosta de fazer na vida é ser meu pai.
Olha, o amor do meu pai tem uma forma comovente que dura no tempo combinando firmeza e ânimo.
Meu pai queria ser sanfoneiro.
Meu pai foi vaqueiro.
Meu pai vive há mais de 40 anos de distância do lugar que ele queria ter ficado, cuidando da roça e dos animais. Eu sei as histórias mais bonitas e fantásticas vividas na fazenda "Boa sorte" - e em outras de nome que não guardei.
O Teo vive há 3 mil km de distância do meu pai.
Mas, eu carrego meu pai comigo, vou sendo ele pelo mundo já que ele não sai do Ceará.  Tudo que ele (e mãe) ensinou, toda cidade que morei e todo caminho que andei é ele sendo junto.
Deus queira que o Teo possa experimentar a boa sorte de ser um pouco sanfoneiro, um pouco vaqueiro e um pouco pescador pela boa sorte de ter um avô que sabe contar as melhores histórias que escutei na vida e que tem um colo que abraça como rio.
Eu to chorando, mas é de amor...

quarta-feira, 30 de maio de 2018

Escutei alguém dizer que há ideias que se esvoaçam e de improviso pernoitam em uma comunidade.
Imagine você o arroubo que ganham encarnadas em correios de tímidos e exagerados.
Como tudo que é compartilhado tende a construir a realidade, vão largando da ideia de serem ideias e passam a conceber novas gentes.

Era um elogio essa frase que escutei. 
Quem a falava pertencia a outros tempos.
A única intervenção que nos atingia vinha do mar que sacudido consentia à água ocupar as calçadas mesmo antes das chuvas. E nas chuvas, depositava mais areia que água.
Era de outra cidade que falávamos. 

Deve haver uma geografia no tempo.
Tempo de planalto, tempo de declives...
Uma paisagem política para um momento compartilhado. 

E eis que estou aqui caçando entender seus sinais e predizer os ancenúbios que transfiguram os tempos de depressão em tempos de vales.
A descompostura da terra árida que apenas observa o abeiramento do vale sobrevir.

Brotará olho d'agua.
Me designo olhar para o rio que vai existir. 
E quase entendo que o importante é fazer correr a correnteza. Os remanescentes residentes da depressão reconsideram morar próximo ao riacho.
E ao carregar ideias incomuns, escolhem as extraordinárias, justo aquelas que não espichavam nos tempos de chão árido.

Nos tempos de vale, haveremos de providenciar botes.
Navegaremos.
Iremos até outros relevos enxeridos para com o justo. 
Chegaremos ao cume de onde avistaremos o fundo côncavo e escolheremos não ficar se não estão todos. 
Retornaremos sem revir e a erosão do curso do água terá feito do estreito descampado (em tempos de depressão) um planalto alongado em que as águas e o brio circulam. 
Será de outra cidade que falaremos.  
Quando você foi ainda era verão. 
Nós que aqui ficamos por vós esperando já sobrevivemos a mais um equinócio sem confirmar a chegada do meteoro e agora estamos em uma nova estação: O outono, que se trata de mais uma dessas ficções paulistas que não existem no Ceará. 

Ouvi dizer que os atrasados  países ao norte só chegam até ele em setembro. 
Agradeço a quem traçou a linha do meio do mundo, e dividiu para um lado sul e para outro o norte, nos oferecendo a curiosa vantagem para chegar ao outono primeiro, porque caso contrário eu haveria de me devotar por esperar setembro para usar desse pretexto sazonal como forma para pedir seu urgente retorno.

Já tá é bom de voltar. Que ninguém nunca sabe quando vão inventar uma novidade em formato de teoria que para medir o tempo insiste em desconsiderar que a relatividade do custo dos dias tá no tamanho da saudade. ❤️

[Publicado no Instagram em 21 de março]